terça-feira, 12 de junho de 2012
Olhos nos olhos
Ela entrou devagar na sala, comos se não quisesse nada. Negra, alta, cabelos recentemente cortados, quase rapados.
Uma bolsa grande marron e um vestido longo coloridíssimo contrastavam com as sandálias havaianas brancas, quase imaculadas. Passou por mim olhando para a frente, talvez tímida, por certo desconfortada, como eu, por estar na sala de espera da radioterapia pela primeira vez.
Ela percebeu de cara que eu a encarava e sorriu. "Gostei", apontei para o cabelo. "Gostei muito", acrescentei tentando mostrar convicção. "Que voz rouca é essa, irmão?", questionou a desconhecida. Contei resumidamente, mas bem rápido, sem perceber que ela já me estendia as duas mãos abertas para o toque da amizade, como as galeras e os namorados fazem. "Vamos vencer juntos, companheiro", vaticinou com a voz grave.
Sem graça, pego de calças curtas, perdi o rebolado e a resposta. Olhos marejados, como os meus, me fitavam firmemente, me viam por dentro, por certo.
Ela seguiu então em frente, sentou-se do outro lado da sala e foi chamada antes.
Quando deixei a sala, ela já tinha ido embora. Agora, torço para revê-la. Para agradecer ou receber de novo aquele sorrizão generoso.
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