terça-feira, 24 de julho de 2012

Contagem regressiva

Faltam apenas cinco sessões para o término da radioterapia, caso esteja tudo bem, o que espero com todas as minhas forças, rezas e esperanças.

Estranho: na reta final, me acostumo com a máscara para impedir os movimentos da cabeça, controlo a respiração e os batimentos cardíacos e não sinto mais aquela agonia das primeiras semanas.

Só fico preocupado, confesso, quando a porta não abre e não ouço aquele barulhinho salvador de que a radioterapia, enfim, chegou a mais um final.

Enquanto isso, desde sábado passado, sinto que a energia volta a meu corpo com uma força diferente, tenho caminhado com mais entusiasmo e ritmo e tenho aumentado as distâncias sem me cansar. O mesmo ocorre à noite, quando o sono volta a ser como antigamente, não está vindo mais acompanhado de cansaço nas pernas e ombros.

Não sei se tudo isso é fruto da vontade de encerrar mais um ciclo na minha vida, e aguardar os próximos passos para a cura definitiva do câncer, ou se de fato a radioterapia já avisou a meu corpo que o câncer já é mais aquele perigo todo.

Estou em contagem regressiva para o meu reencontro com a vida.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Alegria, alegria

Entro na fase final, faltam apenas seis sessões e saio da radioterapia com muita mais disposição quando fiz a primeira sessão. E três quilos mais gordo - eita fome desesperada e danada.

Impressionante como o organismo reage positivamente e como muda tudo, até humor, para melhor, e a maneira como encaro a vida.

Rezo a Deus para que tudo esteja certo, oraite, como dizem por aí, e que a última tomografia indique o fim da trajetória. Se não for assim, estarei na luta, pode acreditar.

Nada melhor que um dia após o outro para a gente se encontrar. E acordar com muita disposição ainda é uma das melhores sensações da vida.

Alegria, alegria

sexta-feira, 20 de julho de 2012

Lição de vida

"Sorrir não mata. Viver não dói. Abraçar não arde. Beijar não fere. Rir não machuca".

"Você não tem motivos para não tentar ser feliz'..

O texto acima é de Clarice Lispector, a grande escritora que viveu durante a infância no Recife e que tem uma das obras mais intensas sobre o (RE) descobrimento do humano.

Lição de vida para copiar e colocar na carteira.

PS: O pensamento de Clarice Lispector foi "roubado" do twitter de Alexandra Torres, radialista e mulher de imensa fé

terça-feira, 17 de julho de 2012

Sem voz

O câncer na corda vocal tem um grande inconveniente para qual nem sempre estou disposto a ter paciência: a perda quase total da voz.

Como a radioterapia bombardeia o câncer diariamente, o local fica muito sensível a qualquer vibração e incomoda muito quando forço para tentar ser compreendido.

Não me acostumei ainda a falar com gestos, embora seja descendente de italianos, nem sei usar a linguagem dos sinais.

Falar, só agora me dou conta, é das melhores coisas da vida. Poder se expressar revelando seus sentimentos pela voz é diferente do ato de escrever. Por isso, admiro os atores, os cantores e os oradores.

Gosto de ouvir poesia lida em voz alta, não precisa ser declamada, assim como adoro Luciano Pavarotti e Plácido Domingo (que estará em Fortaleza para a inauguração de uma fábrica em agosto), além da minha cara Maria Callas cantando Verdi, Bellini ou Rossini.

Estou praticamente mudo porque me cansa dizer alguma coisa, mesmo sussurrada. Passei sábado e domingo em casa lendo, vendo filmes e televisão. Não abri a boca, a não ser para comer já que a fome continua a mesma.

O médico diz que após as 33 sessões de radioterapía, se tudo estiver bem, a voz voltará aos poucos, talvez mais grossa, provavelmente bem mais grave.

Até lá, estarei atento a tudo que ouço.

Afinal, compreendo o poder do silêncio dos monges trapistas e o bem que faz uma meditação. Mas estou contando os minutos para voltar a falar porque descobri que é muito bom você poder dizer o que pensa e como pensa.

Por isso, minhas saudades dos tempos da Rádio JC/CBN ao lado de Aldo Vilela e das participações em entrevistas convidado por Geraldo Freire na Rádio Jornal.

Definitivamente, não nasci para ficar calado.

Altos e baixos

Nem todos os dias foram feitos para o sucesso. Nem todas as sessões de radioterapia apresentam melhoras imediatas nos pacientes.

Há dias em que o abatimento parece tomar conta da gente, o desânimo aparece e a descrença com o tratamento nos atinge de uma maneira tão brutal que nem acreditamos que está a acontecer.

Mas continuamos a acreditar que o amor, o afeto e a alegria são as melhores e mais poderosas armas contra o câncer, seja ele de que tipo for. Só quem não tem a doença acredita no contrário.

Não falo de mim, jamais. Não posso me queixar do tratamento, da atenção e carinho que recebo diariamente do pessoal da radioterapia do Real Hospital Português nem da esperança que cada dia fica mais forte.

Escrevo sobre aquela família, pai e mãe, que chegou amparando o filho adolescente da maneira mais carinhosa e linda do mundo.

Hoje, os dois exibiam na face o estado de saúde do filho, que não desiste de lutar apesar de alguns dias estar mais abatido, como agora.

Me deu uma vontade danada de chegar junto aos dois e dizer baixinho: "Ânimo, ele precisa de vocês dois assim como nós, aqui, precisamos de vocês três e do sucesso de seu filho".

Não disse porque achei que interromperia aquela união de uma família na sala de espera da radioterapia: o filho encostado no peito da mãe, o pai abraçado com a mulher.

Neguei a desmanchar o quadro, mas fui surpreendido pelo imenso sorriso que a mãe me dirigia como se advinhasse meus pensamentos e o que escreveria.

A vida, como a doença, é feita de altos e baixos.

terça-feira, 10 de julho de 2012

Vida nova

Aquela mãe que embalava o filho adolescente no colo enquanto era abraçada pelo marido na sala de espera da radioterapia do Hospital Real Português não é mais a mesma.

O rosto da jovem mãe está iluminado, o sorriso tomou conta de seus dias e a alegria passou a fazer parte também da vida daquele pai sempre presente, calado e discreto.

O motivo é o mesmo: o menino que chegou amparado pelos dois, que dificilmente conseguia se mover e caminhar por conta própria e que parecia sofrer muito, também não é mais o mesmo.

Ele já conversa, mexe com o celular na internet, sorri muito, caminha, apesar de uma certa dificuldade, e demonstra estupenda melhora com a radioterapia. Uma mudança em apenas duas semanas.

Por certo, resultado da força de ser jovem e do acerto da medicação, mas consequência do explícito amor dos pais e do carinho que é tratado por todos.

É como se uma vida nova tivesse se apossado daquele corpo jovem e moribundo e mexido com todos nós.

Sopa caseira

Não costumo nomear os personagens do blog, até por respeito a quem conversa comigo quase em total confidência. Hoje, porém, será uma exceção pela delicadeza da história.

O nome é Dorinha, tem pelo menos 50 anos, mas poderiam ser bem menos. Faz radioterapía para curar um câncer de mama após ter sofrido muito com as consequências danosas da quimioterapia. "Ela me maltratou muito, muito mesmo, ficava caidinha, sem muito ânimo", contou.

Hoje, já na fase final  da radioterapia, Dorinha tem um ânimo encantador para contar histórias, falar sobre o tratamento e incentivar os pacientes a seguir em frente, sempre com muito ânimo e alegria.

Agora, diz ela, já pode se considerar em um ritmo normal de vida, apesar de uma certa insônia que a atacou na última semana. "Mas não perdi o ritmo não. Acordo cedo, faço o que tenho fazer em casa, cuido das coisas e me mando para o fogão para cozinhar. Adoro cozinhar e fazer uma sopa, que a família adora e que eu gosto muito que todos gostem".

A sopa de Dorinha é famosa no bairro, na rua onde mora e já é conhecida dos pacientes. Leva carne de vaca, vários tipos de verduras e um tempero todo especial, mantido em segredo. Sobre sua nova vida, Dorinha revela que muita coisa mudou, pode-se dizer até que se considera uma nova mulher.

Hoje, garante ela, "sou a nova Dorinha".

A voz do dono

Como previsto pelo oncologista Jonathan Melo, do Real Hospital Português, a minha voz chega a seu limite mais baixo e sem força. E a tendência até o final da radioterapia é ficar ainda pior.

Pior? Pode ser possível?

A jornalista Gerlândia Bezerra, que foi  durante anos minha companheira aqui no Jornal do Commercio (ela era da TV Jornal), é quem tem toda a razão. Eu, que adoro falar, segundo avaliação dela, e eu concfordo, fui ter um câncer bem na corda vocal.

A voz, porém, promessa médica, deve voltar aos poucos. Vou esperar.

O dr. Jonathan Melo me perguntou na primeira consulta, logo após a biópsia que confirmou o câncer, qual era minha expectativa em relação ao retorno da minha voz. Não tive dúvida ao arriscar: Se o senhor conseguir que ela volte igualzinha a do radialista Geraldo Freire, ficarei eternamente agradecido.

A voz que vier, eu traço. Só quero é estar vivo! 

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Minha galera

 A radioterapia me proporciona momentos inesquecíveis, como aqueles que converso com algumas pessoas, pacientes como eu.

Confesso até que gosto de trocar ideias sobre o tratamento, ouvir como cada um enfrenta os problemas que surgem sem a gente querer e como eles conseguem vencer outros.

Já percebi que entrei naquela boa rotina de chegar antes da hora marcada para o atendimento apenas para poder estar junto com aquelas pessoas muito especiais, que carregam os seus problemas e a sua esperança de alta. Agora sei como é bom a troca de experiências e como as conversas só me fazem bem. Algumas histórias são pesadas, tristes, trágicas até, mas estamos ali para dar suporte a quem precisa, unidos.

Já somos cinco. Amanhã poderemos ser muito mais.

É a minha galera.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Dia de festa

 Amanhã será dia de festa e de despedida na radioterapia do Real Hospital Português.

Nada de salgadinhos, refrigerantes ou balões coloridos, mas a certeza, para quem fica, de que um dia será a sua vez.

Dois pacientes, um com câncer de próstata e o outro na corda vocal, realizam a última sessão de radioterapia e a notícia se espalhou como vitória na Loto.

Afinal, a última sessão chegará para todos, mas ver a felicidade estampada nos olhos dos dois homens deixa qualquer um emocionado e parceiro na alegria, dele e da família.

Será dia de festa para os que partem para viver a vida livre de um câncer (só estará sujeito aos cinco anos de manutenção), mas um dia muito especial para nós que permanecemos.


segunda-feira, 2 de julho de 2012

Força jovem

 A jovem ao meu lado fecha os olhos enquanto espera pela radioterapia.

Já passou pelas sessões de quimioterapia sem enfrentar enjôos, dor de cabeça ou cansaço, uma sorte danada. Sofreu apenas com a queda dos cabelos e um soninho após as sessões.

Ela descobriu um câncer de mama enquanto amamentava o primeiro filho, um recém-nascido.

Hoje, aguarda pacientemente o fim do tratamento, vive no Interior do Estado e está cansada desse ir e vir todos os dias deixando o filho com a mãe.

A jovem sabe que afeto e bom-humor são armas poderosas contra qualquer tipo de câncer. Por isso, resignada, mas jamais vencida, prepara-se para um ato definitivo em sua vida já que a doença mexeu com a sua autoestima e principalmente com a vaidade.

Ela promete jogar fora a peruca que encobre o lento crescimento do cabelo e assumir para todos a doença que vence aos poucos com muita alegria e muita beleza. 


Pauta própria

 A radioterapía se incorpora ao meu dia a dia, como ler jornais pela manhã, ouvir o Mário Neto e o Aldo Vilela na Rádio JC/CBN, marcar entrevistas e telefonar para fontes, mesmo com pouca voz.

O inusitado é que descubro que pela primeira vez cuido de mim mesmo antes de qualquer compromisso.

Batismo de fogo

 Aos 80 anos e com um câncer na laringe, ela é das mais animadas com a recuperação progressiva e com a diminuição das sessões de radioterapia.
 
"Fumei durante 60 anos e agora luto por mais vinte", revela a senhora sempre sorridente e que, como eu, tem horror àquela "máscara de ferro" que nos impede de mover a cabeça durante a radioterapia, mas que sufoca. E o diagnóstico chegou após persistente rouquidão e perda da voz (semelhante ao meu caso).
 
Ao lado de sua acompanhante, sempre de bom-humor e falante, ela me passa a segurança de que a melhor terapia para o câncer é mesmo o afeto. Que o digam as filhas, uma vive no Recife, está quase todos os dias com ela; a outra, residente no Rio de Janeiro, retorna ao Recife pelo menos uma vez por mês para estar com a mãe.
 
As quatro, por sinal, já planejam uma festa para o dia depois da alta médica e o término, enfim, da radioterapia, das dores, das incertezas.
 
Uma festa que terá início com uma missa de ação de graça e um almoço para familiares, amigos e admiradores, que são muitos.
 
Sugiro que o chão seja coberto com folhas de canela, eucalipto ou mirra. "Mas isso é coisa de batizado", lembra a senhora com um sorriso de aceitação.
 
A intenção é essa, explico. Afinal, a senhora festejará o seu segundo batizado, em nome de uma nova vida após tanto sofrimento.
 
Um batismo de fogo.